Gosto de ser e de estar
E quero me dedicar a criar confusões de prosódia
E uma profusão de paródias
Que encurtem dores
E furtem cores como camaleões
Gosto do Pessoa na pessoa
Da rosa no Rosa
E sei que a poesia está para a prosa
Assim como o amor está para a amizade
(Caetano)

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

A busca


Sei que em algum lugar há
A paz que necessito sentir,
O brilho do infinito a cintilar,
Refúgio certo para o coração se alojar.

Sei que onde busco é impossível
Obter o que é, de fato, preciso,
Ser feliz, sem exceção...

Sei que estar no escuro é carecido
Para valorizar o que é sólido,
Dizimar o vazio sórdido,
Dissipar o conflito aborrecível.

Onde habito haverá sempre lugar
Para todo e qualquer um estar,
Mas almejo a porta menor,
Aquela estreita, apertadinha,
Onde, para se encontrar,
Muita peleja é imperativo enfrentar.

Por onde começar?
Aonde retornar para revitalizar
As forças tão necessárias para lutar
E matar os leões que nos fazem caminhar?

Isabela Resende

Buscando a perfeição


A perfeição me convida a visitá-la,
Mas se nega a fornecer-me endereço.
Onde mora esse espectro? - pergunto-me.
Em que mundo reside ao certo?

E um senhor me responde firme:
Para alcançá-la, necessitas um norte
Que apure teus sentidos, teu fado.
O mestre, tua busca escolhe.
Cabe a ti embarcar e aceitar a morte.

Que morte, senhor, que morte?
Como viver e, ao mesmo tempo, morrer?
Não compreendo, faças-me entender!

Essa morte está em renegar-se,
Abandonar tudo o que nos prende,
Para seguirmos em frente, e, destarte,
Descobrir terras além, distantes.

Isabela Resende

domingo, 24 de outubro de 2010

União mágica



Superamos manhãs, entardeceres e noites.
Ultrapassamos barreiras outrora intransponíveis.
Fugimos de muito do que fugia ao nosso controle.
Suplantamos cegueiras, mistérios e dúvidas.

O que agora virá para nos avaliar?
Será que o céu abaixo chegará?
É possível que o mundo estremeça?
É presumível que novos tsunamis aconteçam?

Sei lá...
Sou apenas sabedora de que quero gozar,
Viver a vida, deixando-a me levar
Ao melhor lugar que considerar
Ideal para contigo eternamente estar.

Se necessitar,
Mais montanhas quero ver brotar
Para galgar cada espaço em que pousar
E o gosto da vitória experimentar
Com o teu e meu corpo
E, enfim, aqui estar aqui para ver
Novos corpos nossa vida vivificar!

Quero ter você sempre em mim
Neste, naquele, em qualquer lugar!
Amo-te densamente mais
Do que suponho o que é amar!

Isabela Resende

sábado, 23 de outubro de 2010

Discrepâncias


Escureceu em mim o branco
E o negro, alvo se tornou.
O que gera tal discrepância
Senão a experiência adquirida?

O mel transformou-se em sal
E este, doce se tornou.
Oh, discordante interior!
Por onde anda teu rumor?

Faz-se impávido o horizonte
Que transmuta até a dor,
Conferindo-lhe experimentos
Que suscitam apenas amor.

Da guerra surgiu a cor
Que mais vigor acarretou
E detalhes ao ícone somou,
Fazendo brotar suave olor.

Sabedor de que compreende
Este espaço frio e quente,
Deixo-lhe um afago envolvente
Alternado com sorriso emoliente.

E, assim, a oposição
Ganha nova direção:
O equilíbrio, menos tensão,
Banha de calma esse coração!

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Faltou, sim, conjugar


Faltou, sim, conjugar
O mais complexo dos verbos:
Amar.

Eu amo
Tu amas
Ele ama

Nós amamos
Vós amais
Eles amam

Eu amo.
Tu amas?
Ele ama.
Ela ama.

Nós amamos.
Vós amais?
Eles amam.
Elas também.

Eu amo.
Tu não amas,
Mas ele, sim,
E ela quis amar
Não pode, contudo, na ideia embarcar,
Pois o julgo imperou em seu lugar.

Uma chama queria inflamar
Um mundo que almejava rebentar
Para em gozo se permitir deliciar
E completar aquele ardente lugar.

Fingiremos, pois, que amamos
Para podereis também amar,
Pois com exemplo se consegue lugar
Para com crédito fiado levar.

Se a vitória estiver em conquistar
O amor em teu cerne e cravar
Que o mundo ame, sim,
Sem fim a rumar,
Para que haja um doce lugar
Onde todos possam entrar
Para de carne e pão se fartar
E almas conseguir transformar.

Assim, multiplicar-se-á
O maior dos antídotos que há:
O amor, o amar
Além do céu,
Além do mar!

Isabela Resende

A importância do antes


Há um sujeito que grita,
Procurando um espelho que reflita
Sua imagem e semelhança esquisitas
Para acalmar a dor que depreda.

Há um marco que densamente habita
O cerne da alma que brada
Atenção para toda a gana
Que lhe consome o sono e os dias...

Há um abismo que fielmente preserva
A diferença entre o meu e o teu nome
Para zelar por almas que dependem
De nosso centro imperando neste leme.

Há um segredo a ser revelado:
Teu bradar será sempre sufocado
Por teus medos e dores que originam
Destempero,
Vaidade,
Rechaço.

Há um pedido simples a ser feito:
Tenha cuidado, sujeito,
Palavras vêm e não retornam...
Atitudes cravam e não desmontam...

Cuidado, indivíduo!
Pensar, somente antes de atacar.
Do contrário,
Caminho reverso não há.

Isabela Resende

Verbalizar


Sentir
Falar
Ferir
Perdoar (?)

Sentir
Pensar
Ponderar...

Aquietar
Amadurecer
Serenar...

Proferir
Acrescentar
Salvar
Elevar...

Multiplicar
Somar
Diminuir
Dividir
Resultar:
Transformar...
Amar!
Isabela Resende

terça-feira, 28 de setembro de 2010

O resto é resto...

Posto que a noite brilha
E o silêncio clama reflexão...

Posto que o fogo consome
Lembranças vãs,
que vêm e não se vão...

Há um vago mundo
Por onde clamo a razão...
E uma dor lenta afaga meu peito
Como punhal e pena em meu coração.

A verdade hoje sei:
Não fui, não sou, nem serei santa não...

Mas o martírio de outrora me fez Senhora,
dona de minha emoção.

E não mais fartará como pão
Minha lapa de misérias e mistérios,
Pois não sou mais a mesma não.

Consisto-me forte e leal,
Comigo, com meu irmão,
Visto que aprendi a ser
A voz que comanda o coração.

O resto é resto, mais nada
E nele será posto concreto
Para que o mundo abjeto
Seja, enfim, resíduo manifesto.

Isabela Resende

A vitória do tempo


A certeza se foi...
O incerto se abranda...
Chega manso como um gato,
Exigindo cautela e tato...

O inimigo me queimou
Com seu fogo criador
E uma certeza em mim deixou:
Mais belo e franco que ele,
Só o amor!

Graças a ti hoje sou
Tua face reluzida em meu voo...
Tua façanha de outrora
fogo em mim ateou.
E queimar-me por inteira?
Não funcionou.

Encontro-me a todo vapor,
Embebida em mim, com louvor,
E teu feito hoje somou
Maturidade, paciência, frescor.

Acima de mim, o céu,
Abaixo, as flores do campo,
Ao lado, a alma que a minha encontra,
Atrás de mim...
Teu clamor.

Passou, ser errante, passou...
E, como tudo passa,
O céu, o seu, passará.
E, se a amarra de outrora ousar chegar,
Aqui estarei, nova em folha,
Gloriosa para desatar.

Quer apostar?

Isabela Resende

domingo, 1 de agosto de 2010

Forças para continuar...

Desejo forças
para não esmorecer
em meio ao turbilhão
que em minha mente brota
quando estou com você.

Por que assim tem de ser?
Não sei dizer,
mas creio não haver de fazer
diferença nenhuma para você
quando longe de ti me encontrar...

Tudo escuro agora está...
Por que há de ser tão cruel
essa dor que me consome hora a hora
e faz-me ficar tão louca
para que tudo isso termine
e,enfim, a paz reine?

Há outros nortes para se chegar?
Sei lá...
Tudo o que no momento sei
é que contigo quero estar
nesse turbilhão ou em qualquer lugar
em que haja um pouco de nós
e do maior dos bens:
amar, amar e mais amar!

quarta-feira, 28 de julho de 2010

Cidadão do mundo

A Guilherme Moraes da Silveira, 
grande referência para minha vida, 
a quem sou grata por me ajudar a reconstruir 
a minha jornada!
Transcender limites,
esbanjar ternura,
transportar muralhas.
escancarar bravura...

Oh, peregrinar,
errar em busca de um tudo
que não se resume, pois,
em um vão, parco reduto!

Largas aspirações
benquistas sem cansaço
em busca de um fim
bem longe de um só regaço...

Cidadão do mundo,
que repudia limites,
idealista és
e também otimista,
ativista,
longa vista,
alta crista...

Abata as diferenças,
que jamais serão
meras coincidências!

O universo é seu mundo
e o mundo, seu fim.
Limites, portanto, não há
se for para, enfim,
o alvo acertar.

Quando tempo levará?
Ah, para ti jamais importará,
visto que o fim maior será
o bem comum a prosperar!

Estou contigo e não nego.
Mas se um dia negar,
açoite-me para acordar.

Entenda isso como prece,
pois aquele que padece
sem cobiçar algo maior
nega sua maior utilidade:
trabalhar por um mundo melhor!

Cosmopolitamente,
Isa Resende

terça-feira, 27 de julho de 2010

Quem me dera... (pensamento)



Gostaria de poder viver de olhos fechados para não ser consumida pelo poder desse mundo, com seus açoites materiais, velocidade por demais e tudo o mais. Se pelo menos uma parte de meu dia pudesse ser vivida no escuro de minhas entranhas, que bom seria! Um remédio para o mal surgiria e tudo, enfim, renasceria!

Isabela Resende

quinta-feira, 22 de julho de 2010

A importância de estar bem acompanhado


Há quem diga que “em boca fechada não entra mosca” ou “às vezes é melhor ficar quieto e deixar que pensem que você é um idiota do que abrir a boca e não deixar nenhuma dúvida”. Porém, alguns eventos são dignos de explanação, mesmo que, a priori, sejam interpretados como maledicentes, aos olhos de quem não estava presente no momento em que ocorreram. Mas...
Mário limpava seus óculos. Esther, imersa em seus trabalhos manuais, até então, mal notara a presença do marido na sala. A noite seguia fria, tranquila, sem maiores preocupações. Já tinham colocado em dia a conversa habitual, sem novos eventos, pra variar, e ausentes de quaisquer rebuscamentos e aprofundamentos em questões que, aos olhos de muitos, mereceriam maior saliência. Reunidos na sala há mais de uma hora sem interromper o silêncio que abrasava o ambiente:
- Mário, não lhe incomoda esse marasmo? – proferiu Esther.
Assustando-se com aquela voz estridente em meio à tranquilidade, respondeu o marido em tom irritadiço:
- Bem... Até onde minha parca sabedoria me permite compreender, o silêncio só incomoda àqueles que não têm o sossego necessário para contemplar o que há de mais belo na calmaria, que é a possibilidade de reflexão e de abertura de portas para enxergarmos o que realmente necessita ser percebido: nós, IN-DI-VI-DU-AL-MEN-TE.
- Ah! Falta de assunto agora virou sinônimo de reflexão... Desculpa para tudo se encontra, meu caro! Vejo que nem de amigo posso chamá-lo mais.
- Às vezes, querida, o silêncio é o melhor amigo de quem busca vasculhar seu sótão para organizá-lo. Além do mais, você reclama de falta de assunto mas não traz nada de novo para contar, além de achaques da vida alheia ou as máximas da última novela da Globo! Como queres que eu embarque nas viagens que somente a ti aprazem?
- Arrogância agora tem outro nome, Mário?
Depois dessa, foi-se Esther fazer o que fazem todas as pessoas em situações calamitosas: dormir no lugar mais quente da casa.
A ausência de individualidade, discussões, reflexões, trocas de experiências afetou seus modos de ser e enxergar o mundo e a vida. Descontrair, celebrar a juventude de seus espíritos, na galante companhia de um tanto de bebida e cigarro, não era mais cunho aprazível daquela relação.
Porém, “trezentos” anos de vida a dois só pode ser mesmo rico e prazeroso se a união tiver sido firmada entre seres que, acima de tudo, apreciem e necessitem estar sós para rever e descobrir novos mundos e, então, compartilhá-los com outros mundos.
Para tanto, há apenas uma moral: que unamo-nos, pois, a alguém com quem, antes de mais nada, apreciemos conversar, visto que, ao findar-se a magia da juventude, restarão ainda algumas grandes preciosidades: lembranças e uma boa companhia para permanecer ao lado até o fim de nossos dias, seriedade com a qual deve ser encarado um casamento.

Feliz ou infelizmente, é o que no momento compreende
Isa Resende

Palavras jogadas ao vento (acróstico)


Poder que, uma vez lançado, não mais retorna intacto.
Antídoto contra o bem e o mal, sem bem utilizado para tal.
Leque de amplas possibilidades.
Abre-caminhos para mentiras e verdades.
Viril é seu poder, quando letal.
Real é sua força quando um ser invade.
Amizade é seu nome, quando leal.
Sem limites é seu peso, quando fatal.

Jocoso é seu tom quando feridas afunda.
Odioso é seu título quando almas deprava.
Grandioso é seu sentido quando em um ser inunda
Aquele lado obscuro que ninguém se aprofunda.
Doloridas suas feridas se seu peso sorve
Almas aladas carentes de sorte,
Sofridas com a dor de qualquer morte.

Ao seu poder não se basta render.
Observai-as, pois, para nascer e renascer.

Vender-se um bocado delas,
Entranha-se um incidente: a falsa modéstia.
Não proferi-las, pois?
Tolo quem crê em tais desculpas esfarrapadas e
Odiado será para sempre no reino das almas iluminadas.

Instinto maternal


Ventre que pulsa,
entranha que clama,
pandulho que convulsa,
instinto que chama...

A vida se convida
para em mim pulsar...
O que impede, pois, a cria?
Ah, tenho que trabalhar!

Canal e mente abertos...
Relógio comanda o tempo...
Já não é hora de brindar
um breve novo advento?

Sim, claro!
Mas coragem é para poucos...
Necessito um chão maduro
para embrenhar-se comigo no jogo
onde apenas um vencedor reinará!

Mãe, palavra doce,
que me convida a palavrear
sobre o que sinto em mim hoje:
anseio esse sonho realizar!

Boneco ou boneca,
não importa o que virá,
careço experimentar
um ser dentro de mim pulsar...

E tudo o mais não implicará,
pois o sentido se instaurará
e o mundo vibrará
encorajando-me a lutar.

Vamos, amor, amar,
amar e mais amar...
Se esse sonho se realizar,
o restante se fará...

Pois a vida é sempre bem-vinda
e o mais é pura sorte...
Quem comanda, portanto, esse norte?!?
O mesmo Ser que comanda a morte!!!

Renúncia de mim,
de ti,
de nós...

Pensando bem, amor, é cedo ainda!

quarta-feira, 21 de julho de 2010

A magia de respirar


Com a respiração certeira,
um frescor se aproxima
para organizar a cocheira
que de ousadia se ilumina.

Sentir o ar nas entranhas
é como remédio que apanha
todas as dores do mundo
e as transforma em artimanha.

Presa fácil, outrora,
não mais simplória torna-se
sua mente clarifica agora,
sua existência,
mais fácil se contorna,
pois pacifica-se
e, no milagre, fita-se.

Breve vida,
bandida
leve bebida,
curada ferida...

Após ser refletida
pelo ar que desemboca das narinas
ganha viço, existência,
história,
estória,
biografia!

Um brinde a esse presente
Que vida se chama, simplesmente!

Com vigor,

Isa Resende.

terça-feira, 20 de julho de 2010

O maior dos presentes


A vida é um grande presente,
pra ser visto pouco a pouco
pra que seja consistente,
pra que seja bom ser louco.

Isabela Resende

sábado, 10 de julho de 2010

Destino



Por mais que tentemos acertar o alvo que consideramos preciso, se não obtivermos a permissão divina para tal, todas as flechas não passarão de palitos toscos para capturar aperitivos. Nunca se findarão as preliminares. Nunca se alcançará o clímax.

Liberdade

Erro o alvo.
Acerto o olho.
Perco o chão.
Enlaço-me ao velho.

Canta, canta, razão,
Senão lhe dou um bofetão.

Quero o novo,
sorriso abrasante,
contagiar seres errantes
com alegria ardente.

Canta, canta, razão,
Senão lhe dou um bofetão.

Autenticidade, sorte.
Liberdade, morte
à vida daqueles
que almejam apresar a minha.

Canta, canta, razão,
Senão lhe dou um bofetão.

Acerto o alvo,
descanso em terra firme,
Chega-me o novo...

Eis que canta a pobre razão,
com olhos roxos e sem dentes.
Mas...
Feliz!
:)

Ai, pelica que pinica!

Com luva de pelica,
um tapa na faceta,
um balde de água fria,
corta-tudo poda vida.

Coração bandido,
tu és mesmo vagabundo.
Ousa, aquieta-se.
Sossega, impõe-se.
Acerta, contém-se.
Vira mundo...

Confusão fatigante,
Vício cruciante,
Clamor extenuante,
Petição desmoralizante.

Ame-se, deleite-se consigo,
pois no abrigo do inimigo
não se pode encontrar asilo.

segunda-feira, 21 de junho de 2010

Graduação de uma alma


Um não-sei-quem,
Um não-sei-como,
Um escuro sem amanhecer,
Com deslizes um ser assombra.

Fantasmagoria entorpecida
Estranho gnomo
Fardo malicioso
Precioso pomo.

Do altíssimo infinito
Reluziu esse espectro
E, em ermos jardins,
Frutificou desertos.

Sombra e luz ocasionais
Gemidos distantes por demais,
Assombro inebriante,
Fumaça cinzenta, inquietante,
Passageiro errante,
Divino império decadente...

Transeunte do infinito,
Ser proscrito,
Enviado de mundo desconhecido,
Passé!
Tudo passa, terror bandido.

Insepulto estivera
Inumado estás agora
Vá adiante, vulto segredado.

Seja o que for,
Parta levemente.
Ao teu sofrer sagazmente esquecido
Faça brotar reluzente brilho,
Pois no paiol de tua esperança
Já não mais há para ti asilo.

Coragem, cavaleiro sombrio!
Que o vento o arranque para qualquer recinto
Onde nenhum ser maldito
Possa achá-lo escondido.

Se assim for,
Os sonhos que gozou ou gozará,
Sem bendizer ou amaldiçoar,
Os lusco-fuscos os farão presentes.

Arremesse-se macio, doce, breve.
Voe em paz,
simples, honesta, sinceramente!

Com beijos de luz,

Isa Resende

quinta-feira, 17 de junho de 2010

Piedade


A leveza se escondeu,
o temor não esmoreceu.
Descubro, pois, que não sou
o que penso em mim existir.
Amordaça o peito um sentir
que enlaça o olvido e o porvir.

O que antes jazia perverso,
faz-se sinistramente saudoso.
Em que no amanhã aposto?
Na sorte, no fim, espero.

O sorrir não se faz brilhante.
O sentir tampouco é instigante.
O cantar, ora perfeito, angustiante,
origina um clamor latente, abrasante.

Aposto em meus versos nefastos,
agonizantes vozes que curam,
palavras enfadadas, tédio,
mas com fim postulado em remédio.

Gritar ao mundo o que penso;
acalmar vozes que repenso;
bradar dores que consomem;
conter em mim este leme...

Ensurdece, pois, um canto
que opta por não ser livre.
Emudece a voz de um poeta
que não mais voa, reprime-se.

Aquela fé, aquele torpor,
Aquele afã, aquela flor...
Resquícios de si, nata fina,
tormento, fremir, langor,
dissimulados na menina...

Ai de mim, Senhor!
Desfalecer,
não saborear essa dor...
O morrer em meu existir
assenta-se, por fim, um fervor!

Piedade, Senhor!
Piedade, Domina Dor!
Piedade, Mata Dor!
Piedade, Cria Dor!

Sabe Dor, piedade!
Por Amor, piedade!
Com ardor, piedade!
Sem pudor, piedade!

quarta-feira, 9 de junho de 2010

Doar-se com fim



Tudo o que sem limites se doa tende a se tornar, um dia, por demais, banal. Doar-se, portanto, com fim, parcimônia, em alguns momentos, não causa moléstia alguma, somente benfeitorias; não significa ser puramente egoísta, mas estar municiado de um poderoso elixir capaz de preservar a beleza e a pureza de alguns sentimentos e eventos que fazem parte da vida.

terça-feira, 8 de junho de 2010

O condutor de almas


Novamente ele chegou aprumado, cheiroso e envaidecido com o público que o admirava e, mais uma vez, adorava como se fosse o verdadeiro Todo Poderoso aqui na Terra, acalentando almas sedentas de conforto. Abençoou seu rebanho, pregou bonito, impôs moral e advertiu sobre pecados que, em tempo algum, deveriam ser cometidos por suas ovelhas desgarradas. Era sábado à noite, fim do dia em que, segundo a Gênese, todo o processo de criação fora finalizado.

Esse condutor de almas era um sujeito popular, devido a seus feitos dentro de sua comunidade: salvara muitas almas e orgulhava-se disso, o que, em princípio, não merecia questionamentos. Porém, para ele, se sua missão de colaborar com a melhoria do mundo estava sendo devidamente cumprida, para todos os seus erros haveria sempre perdão.

Bem... Discordar disso poderia ocasionar o início de uma looooonga conversa, tendo em vista a batelada de energia a ser desprendida para vencer um debate com alguém que, acima de tudo, estava preparado para bem exercer seu poder de persuasão, além de ser um desrespeito à autoridade que aquela altiva figura representava.

Mas ele aproveitou o fim da noite de sábado de modo um tanto irreverente (porém, bastante costumeiro para si) aos olhos daqueles que acreditavam em sua estreita ligação com a religião e o sagrado. Embriagou-se e partiu ao encontro da presa certa para despejar seu gozo. No entanto, respeitando seus princípios, antes de iniciar a obra, pronunciou a olímpica receita para a volúpia e seus anexos:

- Em tempo algum, devemos iniciar nosso ato sem, antes, lavar com um litro de água corrente, misturado com vinagre e sal grosso, nossas partes reservadas e, somente após tal higiene, você deverá abrir tuas benditas pernas para esperar meu membro enrijecido penetrar-te. Não encoste-me teu peito e esteja orando para que teu óvulo NÃO esteja sadio quando encontrar meu jorro. Em seguida, oraremos juntos, suplicando perdão a Deus por este prazer proibido. Como penitência, açoitar-nos-emos com esta vara de bambu.

- Já que iremos pedir perdão a Deus ao final, e certamente Ele irá nos perdoar, por que não fazermos tudo isso render bem mais?

- Você tem razão. Poderíamos começar bambu então?

sábado, 5 de junho de 2010


Ar gélido,
pensamentos indigestos,
baixa pulsação...

Cigarro aceso,
café preto.

Tela em negro,
papel em branco,
ansiedade inquietante,
solidão cortante,
amigos por perto...

Amor indefinido,
talento malacafento,
obrigações pendentes
e o maior dos pesos:
os afazeres.

Cigarro aceso,
café frio.

Chuva chorosa,
voz do vizinho,
vista tenebrosa,
rumores ensandecidos...

Choro contido,
deveres descumpridos,
norte vencido...

Cigarro aceso,
café negríssimo.

Prenúncio de domingo,
exaustão já embutida
por pensar que logo, logo
recomeça mais uma lida.

Ordem na cachola,
minha querida!
Não há tempo pra demora!
Jaz bem-vindos os quase trinta
e ainda encontra-se decaída?

Arriba!
Não se espera despedida.
Dispa-se, nesse instante,
de toda e qualquer ferida.
O tempo urge...
Não espera teu sinal de partida!

Decida-se agora,
ou aguarde outra vida!

Um trago de mim


Insignificante alma cadenciada em festim e melancolia.
Saborosa disritmia tresloucada em calor e agonia.
Altiva vitória do olvido, deslembrando o esquecido.
Brutal, ensandecido, eterno ser em conflito.
E o que sou foi construído por um tempo enegrecido,
Lapidado por clamores escondidos, brilhos ofuscados, lamentos reprimidos.
Ave de rapina e beija-flor, mel e toxina, meretriz e bailarina da menina


que chora e baila dentro da menina.

quarta-feira, 2 de junho de 2010

Os sussurros que lanço



Nada mais me prende,
pavor algum me surpreende.
Desejo tudo e nada, sincronicamente.
Cobiço ser presa e pássaro errante,
contradição (in)constante;
ser em conflito,
tão certeiramente (in)definido!

O sono é inquietante.
A amargura, uma constante.
Lapsos de exaustão,
tédio angustiante.

Não sei que destino merece
isto ou aquilo de meus versos.
Apenas sei que, no escuro,
meu espírito embebe
as entrelinhas que teço,
os sussurros que lanço,
bradares intrínsecos
à minha própria vontade.

Se um dia não puder mais pintar versos,
de nada passarei a coisa alguma.
Almas em mim emudecerão
e mais um caminhante serei,
em busca de migalhas
para fartar um coração
que não almejará mais que pão
para alcançar a razão
de tantos ruídos
e ranger de dentes.

O bradar de Racha Muda


Atontada em suas fissuras,
pois coitada foste sempre,
Racha Muda refletia
sobre suas excitações,
decidindo expor ao mundo
umas poucas profanações:

as finas flores mirraram,
e espinhos, pois, restaram...
Será a estação enregelada?
Serão os verões adoecidos?

A todo momento é fato:
crenças se desmistificam.
Tudo o que mordaz se sente,
vazio, por demais, transcende...
É culpa da estação embrutecida?
É dolo da infância adormecida?

Caminhos se acasalaram...
Já não há mais livre arbítrio...
Será a frigidez da estação?
Crivos reprimindo o coração?

Amor, por caridade!
Atenção, por amizade!
Carinho, por necessidade!
A mão, por solidariedade!

Somos irmãos, afinal?
Somos comparsas, por sinal?
Oh, universo animal!
Para que tantos rodeios
se um simples aconchego
faz-se muito para um leito
que possui uma rija história
e unicamente um pleito:
seu peito,
onde me deito e,
suavemente...
adormeço.

Ao raiar de todos os dias,
imposta em mim sempre deleito
com tão sublime enleio
de um parcimonioso coito
atravancado pela ausência de...

Tempo!

Amor, por caridade!
Atenção, por amizade!
Carinho, por necessidade!
A mão, por solidariedade!
E não somente seio...
greta...
embocadura...

Essa afável contextura
não talha fina moldura.
É forçoso um algo mais
para apregoar tal cercadura:

Amor, por caridade!
Atenção, por amizade!
Carinho, por necessidade!
A mão, por solidariedade!
E não somente picadura.

sábado, 29 de maio de 2010

À mais divina entre as marias

À mais divina entre as marias:Maria do Coração de Jesus, e não qualquer Maria; Maria minha, mãe de minha mãezinha.Com muito amor, de sua netinha.

Oh, Pai!
Dou-lhe infinitas graças ainda mais,
pois, em tuas divinas premissas,
em tempos de trevas e agonias,
colocaste, no meio de nós,
tão repleta de glórias e encantos,
a mais formosa criatura,
que mimoseia cada dia
com altivo perfume
e inigualável magia!

Louvo,
exultante de alegria,
tua Terra
e tudo o mais que há nela.
Enalteço, todavia,
princípio, meio e fim
de tanta compaixão e sabedoria,
pois, em tempos de amargura e estupidez,
colocaste no meio de nós
esse casto presente de Luz
chamado Maria!

Maria Amor
Maria Inocência,
Maria Flor,
e não qualquer Maria.
Teu nome é claridade
para qualquer temor
e tua missão, caridade,
cuidado, perdão,
aconchego, calor!

Não é por acaso, Maria,
que estarás para sempre
cravada no cerne da Luz,
fundindo teus benditos acordes
à Altíssima Sinfonia,
ao mais casto dos milagres:
Nosso Senhor Jesus!

Maria Maria,
honro teus préstimos
e professo-lhe serventia
pois és tu,
e não qualquer Maria,
a maior das alegrias,
a mais digna criatura,
a mais radiante energia.

Maria,
sopro de vida,
antes de bendizermos tua alcunha
faz-se cogente a reverência,
visto que não és qualquer uma,
mas a mais bem escolhida,
entre mães e mulheres, para,
no coração do Senhor Jesus,
imperar,
repleta de graça e revelia.

Maria, simplesmente,
Maria, fulgor do dia,
aquela que, unicamente,
entre mil senhorias,
o mais pleiteado recinto habita.

Mulher-acorde
da mais altiva sinfonia,
metade brotada no cárcere
do mais casto dos milagres.

Não sendo, pois, qualquer Maria,
Maria és, personificada em Divina Flor,
acolhida pelo próprio Sagrado
para habitar o Imaculado,
Onipotente Coração de Nosso Senhor!

domingo, 23 de maio de 2010

A história do Amor


Ao meu Amor Roulien Bohrer,
sem o qual não há Sol,
não há Vida.

Fim de sábado, prenúncio de um lindo domingo de março! Com águas, findava-se mais um verão. Era o prenúncio de um outono particular, suscitando nova gestação em mim, fazendo-me retornar ao pó para renascer em um novo e cintilante Sol, que anunciara sua chegada há tempos. Porém, devido à cegueira que há muito me aventurava ensaiar, só percebi seu advento após ter permitido baixar a maré de um braço-de-mar bravio e cinzento.

Era sábado, início de um lindo domingo de março! Aceitava eu, resignadamente, a passagem de uma estação cálida para outra, morna, crendo que a amargura seria inevitável. Mas, ascendia Ele, generoso, cortês, influente, caridoso, companheiro, iluminando tudo, banhando-me a alma com seu licor de calor e miraculosa graça. Permiti, então, que em mim fixasse morada, pois, deste modo, renascer seria conseqüência inevitável e vital daquela respeitável estação:

Neste sábado, começo de um lindo domingo de março, Sol chega faceiro, cumprimentando sua dama com o afã de uma madrugada bem vivida, em que comemorava mais uma importante vitória de sua vida, utilizando todo o seu talento para seduzir a Dona que, desde então, não mais permitiu ser outra. 

Permaneceu, discorreu meia dúzia de versos, e ousaram, enfim, o tão esperado, e inevitável, ósculo. Junto com ósculos, amplexos, afagos, cheiros...

Então, nesse prenúncio de domingo, deu-se o casamento dos dois: Sol, sem pedir licença, injetou em Dona a mais alta dosagem de Luz e Calor que fora capaz e, com a chuva que caía dentro da menina que dançava dentro da menina, fez brotar uma imperiosa aliança entre eles: um reluzente arco-íris unia-os, agora, para sempre.
O tempo passou. Outonos chegaram... Partiram... E, ainda hoje, Dona de seu Sol, Sol de sua Dona, continuam tecendo manhãs e entardeceres de diferentes estações. Mesmo após uma breve separação, porém longa para o Amor, permanecem firmes, alimentando o brilho do formoso arco-íris.

Os deuses contam que não há no mundo história de Amor tão triste como essa, e que o Criador encarregou-se, pessoalmente, de passar uma borracha nos entremeios dessa narrativa. Porém, outra notícia se espalha no Olimpo: as dores existentes nessa passagem foram obstáculos impostos pela vontade, nunca contrariada, do próprio Zeus. Objetivo: colocar os dois jovens à prova de si mesmos para empreender, ao final, o triunfo do Amor. Resultado: Sol e Dona, enfim, fundiram-se, formando uma única representação. Amor é seu nome, propagar sua voz ao mundo, a grande responsabilidade. Não há meios de mudar o final. Esgotaram-se as possibilidades de rejeição deste Sim, now.

Hoje, firmes em um nó, Sol e Dona bailam, brincam, brindam o silêncio, a paz, a alvorada, os entardeceres... Adormecem a cada noite. Renascem a cada dia, exultantes de alegria!

Sorte? Talvez, pois não são todos os escolhidos para embarcarem em uma missão tão importante. Estava escrito? Crê-se também, tendo em vista que tudo fora tão divinamente encadeado que, às vezes, assombra-se quem realmente conhece tal biografia. Contudo, o que verdadeiramente importa é o fato de esta porta aberta, uma vez aberta, não poder mais ser cerrada e que Divino é o Amor, que tudo suporta e em tudo espera resignada, consciente, decididamente.

Com muito, muito Amor,
Isa Resende.

sexta-feira, 21 de maio de 2010

O silêncio do poeta

Homenagem a Welington Magno, poeta mineiro, das Gerais, isso aí!
Gente de minha terra querida, meu berço, minha raiz.
http://recantodasletras.uol.com.br/autores/montanha

Quando o poeta silencia seu canto
é porque em breve
uma estrela a mais
abrolhará no céu,
repleta de luz,
esplendor,
ardor
e flamejar!

Quando o poeta repousa em seu leito
põem-se os anjos a trabalhar
e seu interior enfeitar
com feixes de Divina Luz,
pétalas azuis
e profundo vicejar.

Que maior descrição encerrará
o trovador que se refugia para calar
e, quando regressa ao lar,
põe-se a bradar
com tanto sentir,
tamanho silenciar,
que seu interior
ornado de pétalas azuis,
feixes de Divina Luz,
profundo vicejar,
deleita-se a eclodir e vaticinar
mundos além-céu,
universos além-mar...

Só há como a voz dessa alma nomear
Luz do Sol a Reluzir,
Água do Mar a Rebrilhar,
Mais Profundo Olor,
Certeiro Balbuciar.

Palmas
para o Poeta-Mar,
para o Poeta-Luz,
para o Poeta-Dor,
para o Poeta-Cor,
para o Poeta-Amar!

Ovacionemos, pois,
esse tartamudear!
Esse som que nos faz calar!
Esse brilho que nos acomete
tão afável lacrimejar!

Sinto o poeta em mim,
em ti,
em nós,
em tudo
poetizar!

Eis o verbo certeiro
para incidir em cheio
o universo,
o altar dos cegos,
surdos, calados...

Oh, Mundo dos versos
e de muitos outros cursos
tão bem postos,
descritos,
propostos!

Profundo orbe submerso
em clamor errante!
Gozo pleno e profundo
de um calar arfante,
regozijante, taciturno,
gatuno, rutilante!

Bravo,
Poeta-Mar,
Poeta-Luz,
Poeta-Dor,
Poeta-Cor,
Poeta-Amar
e todo esse tartamudear!

Teu ente respinga em mim
e de mim não quer se apartar.
A não ser que Deus permita,
nesta ou noutra vida,
transcender em teu calar
e, assim,
una a ti embalar,
rumo a Estrela-Mor,
só,
sem dó,
alma alada no Parnaso,
atenuada,
subalterna.

Minha benção, poeta!

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Quefazeres

Fardo desmedido.
Carga desvalida.
Suor à base de açoite,
aquemeneres:
Ande.
Mais rápido.
Nesse instante, ignaro.
Tudo é mandatório,
nada é prioritário.

Nessa desordem, emporisso,
caço o mínimo:
coordenar os pensamentos
para gozar de tudo um pouco,
uma vez que a vida e uma,
mas, ser vivida, para nem tantos.

Rebelar-me?
Careço de pão.
Conformar-me?
Perco o chão.
Arrepelar-me?
Não, não, não.

Oh, rebuliço!
Há outra saída
que não seja abdicar
dessa tão querida e ambígua lida,
visto que também é bandida?

Não admito a submissão
como prenúncio de transformação.
Nascemos para a liberdade.

Omissos, demissos, permissos...
São como crissos:
produtores de húmus para os crassos
chacinarem todas as rosas
e,enfim,
apresarem a primavera inteira.

Pensemos, pois, nisso?

sábado, 8 de maio de 2010

O vácuo ululante de muitos

Contemplo meu lado obscuro
e percebo que, além de hermético,
é surdo.

Vou um pouco mais profundo
e noto também:
ele é mudo.

Aprofundo-me nesse mundo,
aos olhos de muitos, escuso,
e aventuro-me injetar nesse vácuo
uma insuficiência de tudo.

Por não conseguir despontar, concluo:
não é somente conteúdo
o urgente adubo desse reduto, mas
sonhos,
espera,
contentamento com pouco,
o simples duradouro,
aquilo que não se esgota em si próprio.

Volto, assim, ao meu lugar de aspirante,
sabedora, pois, do que é este ponto.

Na busca contínua, prossigo,
procurando obter, pelo menos um tanto,
que já será muito,
do que careço para sair do recinto
onde, há séculos,
encontro-me aflito.

domingo, 25 de abril de 2010

Mistura Fina

1 punhado de vazio,
1 bocado de insatisfação,
1 tanto de sufocamento,
1 pedaço de coração aflito.

Uma dose de melancolia,
outra, de isolamento;
1 pouco de carência,
resultante do desalento
provocado pela ausência
de motivos para contentamento.

1 resquício de amargura,
embaralhada com ansiedade,
permutada em desatino
confundido com pirraça.

1 caminhão de desejos,
outro de virtualidade,
outro de imbecilidade,
com mais um de individualidade,
não da Sadia,
mas da bem barata,
egoísta e ordinária.

Despeje tudo em uma carcaça:
descartável,
sarada,
bronzeada,
assexuada,
sem pelos (isso é muito importante),
com
1 olho de vidro,
1 ouvido meio surdo
e uma boca maldita.

Para enfeitar o cocuruto:
1 cérebro eletrônico
e fios de cabelos bem lisos, coloridos.

Por fim:
para azeitar as veias, sangue azul ou de barata.

Isso tudo em sinergia,
após congelado na mais baixa temperatura,
resulta no que chamamos, hoje,
Moderna Criatura:
fina mistura para uma vida de gastura!

Isabela Resende

sexta-feira, 23 de abril de 2010

Eterno desejo de você (A Marquesa de Sade)

Cola, fixa, gruda,
aperta, arrebata, embrenha-se,
coleta meu suor com a pele;
rasga meu indumento com a boca...

Vamos,
voraz,
candente,
faz-me tua completamente!

Chega,
rodeia-me,
deixa em mim teu perfume!

Fale-me,
baixinho,
bem aqui no ouvidinho,
qualquer palavra com tua voz rouca...

Acaricia-me com tuas mãos fortes;
Afague-me, como só você sabe!

Vamos, pegue-me,
sou tua,
e abro.

Ande,
acerte o alvo como quiser...
Desde que o tenha em mim
profundo,
no lugar mais ardente,
pulsante
e úmido,
sempre será de excelente tamanho!

Pois...

Só quero você aqui,
em mim,
incomparavelmente
dentro de mim.
E NÃO abro.
Isabela Resende

Esses olhares...

Seus olhos espiam os meus e os cantam,
encantando-os com brilho arrebatador.
Porém, que mistério é esse que domina seus olhares,
que ora afasta, ora puxa;
ora repugna, ora repuxa;
ora reprime, ora adula os meus?
Se os olhos são espelhos da alma,
então por que não consigo enxergar a tua?
Se pensar e saber são menos importantes que olhar,
então por que tento penetrar fundo em sua mente?
Será pelo fato de não conseguir enxergar tua alma?
Será porque não me sinto capaz de decifrar teu olhar?
Será que me preocupo demais com o que não é tão relevante?
Será que perdeste, ou perdermos, a capacidade de (nos) amar?
Ah, incerteza inquietante!
Dissipe-se logo. Vá embora!
Não adianta!
Sinto punhaladas fatais com suas manias de olhar:
ora duras, ora maduras;
ora sensíveis, ora incompassíveis;
ora satisfeitas, ora indescritivelmente infelizes....
Quero aquele olhar que me colocava nua.
Ambiciono aquele tal olhar que me enfrentava sem desvios.
Apetece-me aquele olhar que me protegia, abrigava do frio, do medo...
Essas mudanças mudaram tudo!
Então, o que resta agora?
Apostar na incerteza de um amanhã mais feliz
e arriscar, assim, minha juventude?
Não sei.
Só sei que, contudo, careço padecer nesse olhar,
que me tira a razão, levando-me à submissão completa
e à mais pura falta de pudor para lutar por ele.
O que improvisar, então?
Orar?
Esperar?
Lutar para o tempo passar bem rápido e a resposta, enfim, chegar?
Não suporto mais orar, esperar, lutar para o tempo passar...
Pois orações sem fé, nada adiantam;
esperanças ansiosas não surtem efeito;
e o tempo... Ah! Esse não se pode reger.
Então, o que fazer?
Apostar em quê?
Na paciência de sofrer?
No nascer e renascer de cada dia?
Em um insight?
Ajude esse coração aflito!

Isabela Resende

sábado, 17 de abril de 2010

Palavras, simplesmente... Palavras!

Amo as palavras!
Com elas, posso brincar de ser quem eu quiser,
quando quiser
e como puder.

Brado palavras;
elas podem ser minhas, sim!

Com as palavras, posso me fazer
amar e ser amada,
desejar e ser desejada,
respeitar e ser respeitada...
Nua e tua (ou não).

Idolatro as palavras!
Elas são armas raiadas,
acordes primários necessários a qualquer melodia.

Canto as palavras,
e elas me encantam!

Rogo às palavras,
por serem tão majestosas!

Respiro palavras,
e elas me elevam!

Respeito as palavras,
pois são autoridades camufladas em remédio.

Solto palavras, pois
se utilizá-las bem,
posso plantar sonhos,
desejos de mudança.

Oro com palavras, pois Deus está nelas
e gosta de presenciar a utilidade de seu invento
nos diversos eventos da vida.

Sopro palavras, pois
acredito na força do vento
para (e)levá-las aos corações dos aflitos.

Acredito em palavras, sim.
Acredito.
Acredito.

Isabela Resende

Procurando abrigo

De bar em bar,
um sujeito para,
pira e vai...

De trago em trago,
de vento em popa,
procurando asilo.

E sai...

De boca em boca,
obstinando aquilo que...

Em todas as tocas,
(diferentes da sua)
parece cheio.

Mas...

De tanto em tanto,
encontra o medo que...

Em todas as tocas,
(diferentes da sua)
Não se mostra fixo.

E cai...

De papo em papo,
pouco a pouco.

E...

De soco em soco,
encontra um leito que...

De peito aberto,
diz estar cheio
de...

Vazio.

Então, compreende que
não está sozinho.

Sorri, portanto,
louco, louco,
cheio de...

Nada.
Isabela Resende

Não passo de uma “sofista de merda”, pois:

Nem sempre sinto a profundidade de um poema como experimento a dor;
Nem sempre a amargura do outro é a minha própria;
Sou covarde, vaidosa, 
tive medo de ficar só,
do que poderiam pensar de mim,
de não me aceitarem como sou,
de não ser feliz sozinha...

Tenho desejos, busco prazeres;
Não acredito tanto mais no amor,
mas ainda gosto de ler e escrever sobre ele,
a dor, a nostalgia...

Já me achei diferente por ter uma voz;
usei roupas estranhas para me sentir parte do grupo;
achei-me esperta por ter feito curso "superior"...

Almejo conquistar bens materiais,
aprender a dirigir, estudar o que ainda não consegui...

Por essas e outras, realmente não dá para crer que eu sinta
pena dos doentes, esfomeados, favelados,
desabrigados, prisioneiros, refugiados...

De fato, não é possível crer na minha dor humana,
no meu diálogo superficial,
em minha retórica aborrecível...
em meu pensamento “além”...

Mas uma certeza me conforta:
somos iguais na desventura,
na imperfeição, na desumanização,
naquilo que se arreda de nós,
inclusive urina, fezes, suor, orgasmo...

Isabela Resende

O muro que há entre nós

Sem dúvida, há um agigantado muro entre nós.
Tumultuosa
imponente
estremecida
borbulhosa
comovida
muralha entre nós.

Incalculável divisória há muito tempo invencível,
incansável obstáculo instransponível,
certamente, indomável, irredutível...
Indubitavelmente irremovível.

Há como vencer:
o invencível,
o inabalável,
o intocável,
o incrível,
a não ser crendo que é possível?!?

Esperanças se vão
baldadas,
improfícuas...

Desatinado, então, ponderar
que o tempo deitará abaixo
um legado de longas estações de
dores
amores
horrores
calores
temores
cores
tremores
louvores...

Que muro é este, meu Deus,
que lá está
tumultuoso
estremecido
borbulhoso
comovido...
mas...
resistente entre nós?!?

Amargura sem fim...
Concreta
acimentada
petrificada
agonizante
consternação em mim.
Inquebrantável argamassa,
resistente armadura,
potente mureta 
que outrora fora sonho de candura!

Isabela Resende

A beleza da tristeza

A tristeza também é boa, minha gente, pois pode nos fazer parir escritos! Brincadeiras de palavras que podemos não saber se são boas, mas são nossas! Quase sempre aprecio estar só, pois, assim, fica mais simples dar à luz um pouco de mim, uma dosagem de um mundo que fervilha, querendo rebentar, mas é covarde, pois tem medo de errar, não agradar, compreendem?!? É claro que compreendem!

Louvo, portanto, mais do que nunca, a plenitude da tristeza, que deu aos poetas a chance de traduzir muito do indizível, de musicar a solidão, o amor perdido, a saudade, o vazio... Salve o cárcere privado da maldizente tristeza! Esse reduto dúbio, posto que é tenso e apascentado, quente e frio, ao mesmo tempo, e propício a indescritíveis meditações!

Isabela Resende


Ser Inteligente – considerações subjetivas

O que se entende atualmente por inteligência está muito longe de ser comparado ao que realmente significa ser inteligente. O ser verdadeiramente inteligente é capaz de compreender, conceituar, conjeturar sobre o significado dos múltiplos eventos que acontecem ao seu redor, e a inteligência é o aparelho mental necessário para alcançar o conceito e as entrelinhas do que se pretende conhecer.

Atualmente, quando me deparo com alguns indivíduos que foram agraciados pela oportunidade de conhecer um pouco mais que a maioria, ao invés de descobrir sujeitos realmente dotados de inteligência e respeitá-los por isso, percebo seres imersos em um casulo de tanta arrogância que às vezes me pergunto: para que se instruíram tanto? Com qual(is) objetivo(s) resolveram buscar tanto “conhecimento”? Com qual(is) finalidade(s) mergulharam nos livros, a não ser pela oportunidade de se tornarem melhores, mais humanos, conscientes, conhecedores de si mesmos, do outro, da história, dos valores que deveriam possuir (ou resgatar), do modelo de sociedade doente que presenciamos hoje...?

Ao invés de ser um privilégio estar diante de tais pessoas, tendo em vista que a alienação se tornou a imperatriz da modernidade, mesmo com a facilidade que possuímos hoje para nos isentar da imbecilidade, este contato tem sido pernicioso em alguns momentos, pois noto, cada vez mais claramente, que a exclusiva intenção de muitos é apenas alcançar um status em um universo inacessível à maioria.

O conhecimento, poderoso instrumento para humanizar pessoas e promover mudanças significativas em múltiplos sentidos, tornou-se o principal responsável por instaurar na elite intelectual uma intrigante dificuldade de socialização, que culmina no desrespeito ao próximo - principalmente àquele que não teve as mesmas oportunidades de alcançar semelhante grau de saber. Portanto, na confusão a respeito desse ser ou não ser, pergunto-me: isto é ser inteligente? É ignorando ou abatendo o outro por não saber as mesmas coisas que eu que estarei colaborando para alargar seu interesse pela obtenção de conhecimento? Será que desse modo não estarei intimidando meu próximo a dar o primeiro passo em direção à instrução, à leitura? Este é o caminho mais eficaz para mudar o status quo? É mesmo verdade que um indivíduo que não teve a oportunidade de frequentar um ambiente letrado ou de ler todos os clássicos da literatura universal não tem cacife para acrescentar NADA de bom à minha vida e, por isso, deve ser expurgado do mundo?

A intensa disputa de ego nesse meio douto (onde, contraditoriamente, não há somente pelegos) muito me intriga, pois parece que o único intuito de seus membros é se encharcar de "conhecimento" apenas para ter a erudição notada quando estiver diante de uma platéia (mesa de bar quase sempre é um bom lugar).

O conhecimento não pode mais continuar sendo um precipício capaz de distanciar os universos que somos, pois acredito ser uma arma poderosíssima capaz de promover mudanças extremamente necessárias, tanto interna como externamente. Então, por que não colocá-la a serviço do mundo, com o intuito de uni-lo, e não fragmentá-lo ainda mais?

Não estou defendendo a idéia de que todo indivíduo que possui um grau mais elevado de instrução deva estar em uma sala de aula partilhando o que sabe, pois, para isso, é necessário muito mais: vocação, amor e coerência entre o que se diz e o que se faz. Mas que sejam aproveitadas as oportunidades de compartilhar esses saberes para que não se percam com a morte do corpo.

A meu ver, todo indivíduo que realmente aprendeu alguma coisa deveria empreender esforços para se tornar melhor, mais sábio, pois quem realmente almeja estar plenamente consciente de qualquer coisa geralmente percebe que sua jornada tende a se tornar cada vez mais árdua quando continua a caminhar neste sentido. Aquele que realmente tem olhos para ver e ouvidos para ouvir de fato nota que um conhecimento puxa outro e, desse modo, chega à conclusão de que nada sabe, como já dizia, há tempos antes de Cristo, o sábio Sócrates ao afirmar que sua sabedoria era limitada à sua própria ignorância.

A instrução deveria ser encarada como um processo natural, e sua continuidade como algo relativo, dependente das condições de cada indivíduo. Não cabem julgamentos ou indagações indiscretas ao outro a respeito dos motivos que deram origem a suas lacunas intelectuais: antes de julgar, o ser instruído e verdadeiramente inteligente deveria sondar o universo alheio de maneira cordata, para tentar ser útil e, então, mover-se de maneira adequada para disseminar o que sabe, porém, é claro, respeitando as diversas formas de pensar. Do contrário, não vejo sentido algum em saber tanto sobre tantas coisas se a finalidade única é esgotar o conhecimento em si mesmo.

Desculpem-me, por favor, os verdadeiros seres inteligentes e conhecedores.

Isabela Resende

Tapa no passado

Que todas as dúvidas se dissipem...
Que todo o rancor se transforme em mais e mais Amor...
Que toda a angústia causada pela dor, pelas dúvidas e pelo rancor
se transmute e personifique em leveza, beleza, certeza...

Certeza de que dentro de nós baterá para sempre um só coração...
Certeza que para todos os erros já houve perdão sincero...
Certeza que os mesmos deslizes não serão novamente colocados à prova...

Assim, caminharemos juntos,
inseparáveis,
para cada vez mais longe daqui,
do ontem,
da intolerância,
da incerteza...

Que nossos dias sejam ainda mais felizes
a partir daqui,
do ontem,
da intolerância,
da incerteza...
sem a presença das máscaras que outrora feriaram a nossa integridade...

Que o hoje nos torne, ainda mais,
um,
comigo,
consigo,
conosco,
com Deus
e em Paz!

Isabela Resende